Ações de danos morais têm valor inestimável e admitem honorários por equidade, diz STJ
Com isso, é possível que os honorários de sucumbência da parte vencedora sejam fixados pelo método da equidade, e não com base no valor dado ao pedido de compensação.
Esse entendimento foi aplicado, por maioria de votos, para negar provimento a um recurso da Editora Abril, que venceu uma ação ajuizada pelo senador e ex-jogador de futebol Romário por causa de uma reportagem publicada na revista Veja.
A reportagem, intitulada “O mar não está pra peixe”, atribuía ao senador a prática de atos ilícitos. Pelos danos à sua imagem, Romário pediu compensação de R$ 75 milhões. A ação foi julgada improcedente.
O juízo de primeiro grau fixou os honorários de sucumbência, a serem pagos pela parte derrotada, em R$ 15 mil, que correspondem a 0,02% do valor pedido na ação.
Para isso, foi usado o método da equidade: o juiz estabeleceu o valor dos honorários considerando elementos como o grau de zelo do advogado, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho feito e o tempo exigido para isso.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por sua vez, aplicou o artigo 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil de 2015, que prevê honorários em percentuais determinados sobre o valor da causa. Assim, a corte estadual arbitrou os honorários em 11% dos R$ 75 milhões, o que fez a condenação aumentar em 550 vezes, passando a R$ 8,2 milhões.
Em decisão monocrática, o ministro João Otávio de Noronha, relator do recurso, devolveu a condenação ao patamar de R$ 15 mil. A Editora Abril, então, recorreu à 4ª Turma para afastar o uso do método da equidade.
A empresa pediu a aplicação do Tema 1.076 dos recursos repetitivos, segundo o qual o método da equidade, previsto no parágrafo 8º do artigo 85 do CPC, só é aplicável para causas de valor muito baixo ou quando o proveito econômico for inestimável ou irrisório.
Valor indicativo e referencial
O ministro Noronha concordou com o uso do método da equidade por entender que a causa em questão tem valor inestimável. Ele explicou que são de valor inestimável as causas relativas a bens jurídicos a que não se possa atribuir um valor econômico, e apontou que o termo não pode ser tratado como sinônimo de causa de grande valor.
Em sua análise, causas de danos morais, embora contenham um valor de indenização, visam ver reconhecida a responsabilidade pelo danos que foram causados e obter uma reparação.
O valor da indenização tem caráter meramente indicativo, tanto que o julgador pode mudar esse montante livremente. E, se ele for menor do que o pedido pelo autor, não haverá sucumbência recíproca.
“Em conclusão, é de ser mantida a decisão que conheceu em parte do recurso especial e deu-lhe parcial provimento para determinar o restabelecimento da sentença, que fixou os honorários advocatícios em R$ 15 mil”, resumiu Noronha.
Votaram com o relator os ministros Raul Araújo e Marco Buzzi.
Absolutamente estimável
Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Antonio Carlos Ferreira, que contestou a definição de inestimável no caso concreto.
Em sua opinião, esse conceito implica a impossibilidade de quantificação, pois trata de algo que não pode ser representado em dinheiro ou que não permite critérios objetivos para a avaliação de grandeza econômica.
Nessa categoria, encontram-se as ações de Estado e de família. Um exemplo é a ação declaratória de paternidade, já que não há conteúdo patrimonial no reconhecimento do vínculo de filiação.
“Desse modo, entendo que o caso sob exame não se enquadra no conceito de proveito econômico inestimável, arredando a aplicação do parágrafo 8º do artigo 85 do CPC/2015”, afirmou o ministro.
Ele ainda ressaltou que foi o próprio autor da ação quem atribuiu à causa o elevado valor de R$ 75 milhões, o que evidencia o conteúdo econômico de sua pretensão.
“Possivelmente, se acaso fosse vencedor da ação, ressaltaria o fato de que sua contraparte não ofereceu impugnação ao valor da causa para reivindicar o pagamento de honorários sobre essa base de cálculo”, acrescentou.
Tese em desuso
A conclusão da 4ª Turma representa mais um golpe na combalida tese do Tema 1.076 dos recursos repetitivos, que vem sendo sistematicamente descumprida e contestada nas instâncias ordinárias.
O tema ainda pende de definição no Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a repercussão geral da matéria em agosto de 2023. Com isso, o próprio STJ vem sobrestando a discussão e devolvendo recursos, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico.