Agência Senado
Os senadores já se preparam para votar, a partir de agosto, projetos cuja conclusão não foi possível no primeiro semestre. Além de temas prioritários, como a desoneração da folha de pagamentos, as dívidas dos estados, o novo Código Eleitoral e a regulamentação da Reforma Tributária, há outros, polêmicos, em que ainda não houve acordo, como o funcionamento de cassinos, o uso de cigarros eletrônicos, os terrenos da Marinha e a autonomia orçamentária do Banco Central.
O projeto da Câmara que autoriza o funcionamento de cassinos e bingos no Brasil (PL 2.234/2022) foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em 19 de junho. Depois, recebeu 11 emendas, que precisam de parecer da comissão antes da votação pelo Plenário do Senado. O texto também legaliza o jogo do bicho e permite apostas em corridas de cavalos.
O tema é polêmico. Defensores da aprovação argumentam que, nos países onde os cassinos foram regulamentados, houve benefícios sociais e econômicos. De acordo com o relator, senador Irajá (PSD-TO), a aprovação do texto pode resultar em investimentos de R$ 100 bilhões, com a geração de cerca de 1,5 milhão de empregos diretos e indiretos. A arrecadação potencial por ano, segundo o senador, pode chegar a R$ 22 bilhões, divididos entre os estados, os municípios e a União.
Os parlamentares contrários ao texto, por sua vez, alertam para o risco de incentivo à ludopatia (vício em jogos) e crimes, como lavagem de dinheiro, tráfico e prostituição. A votação do texto foi adiada várias vezes na comissão devido à falta de consenso.
Regras
O projeto cria regras específicas para diferentes tipos de jogos e impõe limites para os estabelecimentos comerciais que podem oferecer cassinos, bingos e jogos do bicho. Haverá, por exemplo, o limite de um cassino em cada estado e no Distrito Federal, com exceção de São Paulo, que poderá ter até três cassinos, e de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Amazonas e Pará, que poderão ter até dois, cada um, em razão do tamanho da população ou do território.
As casas de bingo têm o limite de uma por município, mas que as cidades maiores poderão ter um estabelecimento para cada 150 mil habitantes. Já a exploração do jogo do bicho poderá ser feita, em cada estado e no Distrito Federal, por uma pessoa jurídica a cada 700 mil habitantes. Já as apostas em corridas de cavalos poderão ser exploradas por entidades turfísticas credenciadas junto ao Ministério da Agricultura.
A regulamentação inclui a criação de dois novos tributos: a Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos). Do montante arrecadado, 16% irão para o Fundo de Participação dos Estados, 16% para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), 12% para a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), 10% para ações na área do esporte e 10% para o Fundo Nacional da Cultura. O restante será empregado em diversas áreas, entre elas ações de prevenção ao vício em jogos.
Cigarros eletrônicos
Também cercado de divergências está o PL 5.008/2023, da senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), que regulamenta a produção, a comercialização, a fiscalização e a propaganda dos cigarros eletrônicos no Brasil. Apresentado em 2023, o texto está na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e já teve a votação adiada algumas vezes, a última delas no dia 9 de julho, quando foi aprovado um requerimento do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), e a votação foi adiada para 20 de agosto.
Um dos principais argumento de quem defende a regulamentação é a possível arrecadação anual em tributos, estimada em R$ 2,2 bilhões. Senadores contrários ao texto, no entanto, apontam a pressão de gastos sobre o Sistema Único de Saúde, demanda de cuidados pelas famílias e ainda a perda de produtividade na economia. Essas divergências foram expostas em audiência pública sobre o texto, em maio.
O texto define o conceito dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) — categoria que inclui cigarros eletrônicos e dispositivos similares — e estabelece uma série de exigências para a comercialização do produto. No Brasil, a regulamentação dos produtos fumígenos está sob responsabilidade da Anvisa, que, desde 2009 proíbe a comercialização, a importação e a propaganda desses produtos. Ainda assim, os cigarros eletrônicos são amplamente comercializados de forma ilegal.
O relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), é favorável ao projeto, com alterações. Além do relatório feito por ele, os senadores Eduardo Girão (Novo-CE) e Zenaide Maia (PSD-RN) apresentaram votos em separado, mas pediram a retirada após o acordo pelo adiamento da votação.
Terrenos da Marinha
Outra proposição que dividiu as opiniões de senadores e mobilizou a sociedade no primeiro semestre ainda espera uma decisão do Senado: a proposta de emenda à Constituição que transfere os terrenos de marinha — terras da União no litoral — para ocupantes particulares, estados e municípios (PEC 3/2022). A proposta, da Câmara, está sendo analisada pela CCJ e tem como relator o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
A PEC transfere os terrenos de marinha, mediante pagamento, aos seus ocupantes particulares. Quando os ocupantes são estados ou municípios a transferência é gratuita. Os terrenos de marinha são as áreas situadas na costa marítima, aquelas que contornam as ilhas, as margens dos rios e das lagoas em faixa de 33 metros.
Nas redes sociais, o tema gerou grande repercussão, e a proposta passou a ser chamada de PEC da privatização das praias. O relator chegou a anunciar uma emenda ao texto para deixar claro que o objetivo não era privatizar essas áreas. O texto já havia sido discutido em audiência pública, mas, devido à repercussão, o senador Jorge Kajuru (PSB-GO) propôs a discussão do texto em uma sessão temática. O requerimento foi aprovado pelos senadores e a sessão ainda deve ser marcada.
Banco Central
A falta de consenso também adiou para o segundo semestre a votação da proposta de emenda à Constituição que concede autonomia orçamentária e financeira ao Banco Central (BC) e o transforma em empresa pública. A PEC 65/2023, do senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), está a CCJ, onde tem como relator o senador Plínio Valério (PSDB-AM). Em 10 de julho, o texto recebeu voto em separado do senador Rogério Carvalho (PT-SE), e a votação acabou sendo adiada.
A PEC 65/2023 insere na Constituição a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira do Banco Central, já estabelecida pela Lei Complementar 179, de 2021, e acrescenta a autonomia orçamentária. Além disso, a proposta transforma o BC, hoje autarquia de natureza especial sem vinculação com nenhum ministério nem subordinação hierárquica, em instituição de natureza especial organizada como empresa pública, fiscalizada pelo Congresso Nacional com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU).
O governo, por meio de seu líder, senador Jaques Wagner (PT-BA), alega que não é contrário à proposta. O ponto controverso, segundo o líder, a transformação do banco em empresa. Ele sugeriu que os parlamentares construam um acordo que possibilite a autonomia financeira e administrativa do BC, sem transformar a instituição em empresa.